TEXTS / DOGMA - CLARISSA DINIZ

          A incontestável autoridade de um dogma e seus indiscutíveis pressupostos têm atuado como pedra no sapato da prática artística. Daí, as histórias das artes vêm sendo habitadas por esforços de demolição e desconstrução desses dogmas, presenças fustigantes e indesejáveis que, posto que estéticas, são necessariamente sociais, éticas, morais, políticas, raciais. É, portanto, inusitado que tenhamos, com Arthur Palhano, justamente uma invocação ao DOGMA, título de sua primeira individual na Galeria Portas Vilaseca. Educado num colégio franciscano, as organizações doutrinárias há muito são familiares para o artista cuja infância e juventude se deram entre a serra fluminense e a zona norte do Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo em que relações conflituosas com a autoridade eclesiástica no ambiente escolar marcaram sua formação, a constante presença dos ícones e outros símbolos de um catolicismo tão pedagógico quanto dogmático igualmente educaram seu olhar e referências estéticas. Ao compreender-se artista, foi então inevitável que Palhano tenha revisitado este universo que lhe foi de absoluta centralidade, elaborando instalações, desenhos, pinturas e vídeos que investigam o lugar de autoridade dogmática da escola e da igreja, bem como acessam as memórias de subversão e de profanação desses poderes no contexto de um colégio católico, como rabiscos e arranhões sobre uma carteira escolar – lembrança fabulada em Homenagem à garota mais bonita escola (2022). Como exemplo deste momento de sua produção, DOGMA apresenta O lugar do ícone (2019), vídeo instalado no alto do encontro entre duas paredes à semelhança de Kasimir Malevich com sua icônica pintura Quadrado preto sobre fundo branco na exposição 0.10 (São Petersburgo, Rússia, 1915). Ambos, Malevich e Palhano, inserem seus gestos poéticos no espaço que a tradição da Igreja Ortodoxa nomeia como "canto vermelho": local por excelência dos ícones religiosos, ponto simbólico da convergência dos caminhos e, por isso, lugar de reverência. Tradição que se mantém viva em casas do Rio de Janeiro e de outras partes do Brasil. 
         
          Enquanto o russo o fez eminentemente por conta da tradição bizantina, ao artista carioca igualmente interessa o diálogo com o cânone da pintura no qual Malevich se insere, em razão do que sua vídeo-instalação remete a múltiplas dimensões e políticas dos ícones. Ao passo que em O lugar do ícone Arthur se aproxima, com uma câmera na mão, das imagens sacras de igrejas da capital carioca para tocá-las com o olhar como se as profanasse através do roçar dos dedos, o que vemos em DOGMA é que este não é um gesto isolado, senão uma espécie de programa implícito de sua obra ao lidar com o território iconológico tanto do cristianismo quanto da arte. Tocar nas coisas tem adquirido densidade enquanto operação estética e política em sua produção recente. Nessa direção, é emblemática a pintura Dedal (2021), surgida do acidental encontro entre as pontas dos dedos de Arthur Palhano e uma tela ainda úmida. Ali, a força da gravação de suas digitais sobre a tinta a óleo revelou a vocação pictórica do gesto de tatear, profanando a presunção de sacralidade e de imaculidade da pintura enquanto cânone, gênero e ícone. Mais adiante, como quem ativa as lembranças de desenhar nas paredes e mesas da escola, escavando a madeira das carteiras para ali imprimir o indício de sua presença, junto a Dedal – uma pintura nascida da pressão – desdobraram-se, em paralelo, outras obras comprometidas com técnicas menos clássicas de pintar. Para Giorgio Agamben, profanar imagens é “restituí-las ao uso comum dos homens”, desafiando os ritos e as instituições que, para sacralizá-las, as mantêm separadas do âmbito do ordinário. Como demonstra o filósofo ao recorrer à antropologia, uma das formas “mais simples de profanação ocorre através de contato (...) no mesmo sacrifício que realiza e regula a passagem (...) da esfera humana para a divina. (...) Basta que os participantes do rito toquem [as carnes reservadas aos deuses] para que se tornem profanas e possam ser simplesmente comidas. Há um contágio profano, um tocar que desencanta e devolve ao uso aquilo que o sagrado havia separado e petrificado". In: AGAMBEN, Giorgio. 
          
          Profanações. São Paulo: Boitempo, 2012. A partir de 2021, Arthur Palhano passou a navalhar, raspar, desbastar e depilar suas pinturas, as quais têm se construído não por adição, mas por subtração de camadas: um exercício de prospecção que possibilita às imagens emergirem de dentro das obras, do fundo de suas próprias superfícies de tinta a óleo e esmalte. Perscrutando-as camada a camada, talhar as pinturas – técnica de sulcagem da qual Palhano faz uso para elaborar as esculturas também presentes em DOGMA: retratos surgidos de blocos de gesso lapidados por martelos e chaves de fenda – inaugura, ainda, outra forma da presença do tempo na obra do artista. Arthur, que por anos pintou galhos secos velados por finas camadas de branco, tem desde cedo se interessado pela impermanência, pelo tempo e suas transmutações. Dentre outras situações dessa pesquisa são exemplos as diversas imagens de morte em sua obra ou metrônomo instalado em Terraço Coberto (2020), intervenção-exposição realizada na casa de sua família durante um período de nostálgico esvaziamento da residência. Agora, ao pintar por prospecção, Palhano vivencia um novo desdobramento desse campo de interesses, aproximando-se de uma espécie de experiência telúrica do tempo: aquela que provém da superfície, que se dá na sedimentação da matéria e se faz por entre suas fendas e rachaduras. Escavar a pintura, uma operação técnico-formal avizinhada ao gesto arqueológico, adquire então sentido político. Ao trazer à vista as camadas mais antigas de tinta, faturas e cores, o artista age na contramão da suposta linearidade do tempo, perturbando sua versão sucessiva e progressiva com a persistente presença daquilo que devia ter ficado para trás. Sua operação é uma forma de exumação daquilo que a pintura teria um dia sido, compondo-se a partir de uma historicidade que permite a convivência entre diferentes camadas de tempo. Estamos diante de uma consciência histórica que, na obra de Arthur, se torna uma convocação a igualmente exumar os cânones da própria arte e, em especial, da pintura europeia – os ícones que, junto à escola e ao catolicismo, DOGMA se permite investigar e profanar. A obra recente de Palhano se faz, desse modo, nalgum lugar entre a necrofilia da arte e a necropolítica do mundo. Herdeira da tradição da natureza morta, ela não escapa ao fascínio pelo fim da vida, como ocorre na série Empatias programadas (2020), retratos de animais mortos pelo artista na virtualidade do jogo GTA V. Ao mesmo tempo, não acata os correntes paradigmas da finitude com suas programadas (e cada vez mais aceleradas) obsolescências, tampouco abdica da força de presença – como matéria, vestígio, memória, fantasma, etc. – daquilo que supostamente não estaria (mais) vivo. 




          Dessa forma, Palhano se põe a exumar Morandi's, Bonnard's ou Gauguin's ao prospectar a superfície e a temporalidade imanente às suas próprias pinturas, perfazendo um gesto físico igualmente vivenciado na memória e no imaginário do artista. Com a ajuda de estiletes e outros objetos pontiagudos, arranha as últimas camadas de tinta para, nelas, reaver a persistência de imagens que restavam em estado espectral – seja na tela, seja na mente. Presenças invisíveis que aguardavam a possibilidade de fazer-se imagem à medida que vêm à tona e que são postas em uso, tocadas pelas mãos do artista e pelos dedos do mundo. A seu modo, Arthur Palhano vai então compondo sua singular "enciclopédia de história da arte", revisitando seus próprios ícones ao meter-lhes a navalha não para vitimá-los, senão para exumá-los, trazendo-os de volta à vida-vista. O desejo de alisar, com os olhos-dedos, as imagens de um soturno altar de igreja converge com a vontade de cascavilhar, com suas mãos e unhas-navalhas, os cânones da arte. Entre a reverência e profanação desses ícones dá-se o apetite de querê-los bem perto e o anseio de poder tocá-los. Nessa força ética e política de manipulação e manufatura dos ídolos, testemunhamos o encontro de Arthur Palhano com outra possibilidade do dogmático, o DOGMA 95, movimento cinematográfico lançado em 1995 a partir de um manifesto assinado por Thomas Vinterberg e Lars von Trier. Em suas linhas, os dinamarqueses apresentavam o que ficaria conhecido como "voto de castidade": um chamado a cineastas de todo o mundo a se reaproximarem de um modus operandi cinematográfico antagônico à hegemonia da pós-produção que então imperava em Hollywood e na obra de diretores como Steven Spielberg. Integravam o "voto de castidade" uma série de regras que visavam agir como limitações produtivas, excitando a criatividade e o compromisso ético-estético dos cineastas não com efeitos visuais, artifícios de narração ou recursos mirabolantes, mas com o enredo e os personagens apresentados de modo imanente à cena e seu espaço-tempo. Impedir que o som fosse produzido separadamente da imagem, proibir a criação de "filmes de gênero" ou obrigar a câmera a ser usada nas mãos tornaram-se provocações técnicas que levaram os autores filiados ao DOGMA 95 a se perguntarem sobre a natureza política de seus filmes e respectivas escolhas estéticas. Responsáveis por obras como Festen (1998) ou Os idiotas (1998), os diretores do DOGMA 95 – que tampouco deveriam ser individualmente identificados como tal, senão como parte da coletividade que torna um filme possível – só teriam suas obras reconhecidas como integrantes do movimento se suas produções fossem avaliadas como tal, em razão do que deveriam exibir, no início de seus filmes, o conquistado certificado que atestava que a obra fora produzida "em conformidade com as regras e intenções" do DOGMA 95. Como confessam, as equipes dos filmes evidentemente terminaram por burlar uma ou outra regra do voto de castidade, utilizando recursos de luz como cortinas ou, por exemplo, colocando a câmera não num braço estendido, mas na ponta de um cabo de vassoura. Ante o purismo da castidade, provaram que artifícios de criação não são, necessariamente, traições a uma ética da arte. 

          Ao contrário, os diretores do DOGMA 95 experimentaram o que Palhano também faz aludir com pinturas que emulam certificados, documentos, assinaturas, carimbos, autenticações: a compreensão de que as ficções da arte são tão legítimas quanto qualquer outra das ficcionais credibilidades de nossas sociedades. Décadas antes, aliás, nas bandas de cá do mundo, Hélio Oiticica afirmara que "a pureza é um mito", enquanto, ainda no começo do século XX, Oswald de Andrade – ao referir-se à falsidade ideológica da propriedade privada em nosso saqueado e colonizado território – bradara que o Brasil é "um grilo de seis milhões de quilômetros, talhados em Tordesilhas". “O maior grilo da história constatado! “. Portanto, ao clamar que os cineastas deveriam tomar os recursos do cinema em suas próprias mãos, devolvendo-lhe o caráter de coisa manufaturada pelas mentes e corpos das gentes, o DOGMA 95 terminou por demonstrar que também os recursos e artifícios da ficção são, por fim, tecnologias de nossa ação subjetivada e criadora. Ao fazê-lo, legaram à história não exatamente uma presunção de castidade ou de pureza, senão, sobremaneira, o entendimento de que a prática artística integra um jogo acordado entre muitas forças: autores e públicos, historicidades e tecnologias, ficções e crenças, etc. DOGMA de Arthur Palhano é, nesses termos, mais um desses jogos. Calcado em artifícios de auto-extrativismo pictórico, emula historicidades e legitimidades para produzir, reverenciar e, ao mesmo tempo, profanar os contextos de culto e de autoridade que, como a escola, a igreja ou a arte, têm atravessado a vida do artista. Se a exposição principia num tom glorioso com Trombetas em brasa (2022) – uma pintura vestida de bronze, clarins e troféus –, o caminho pelo qual Palhano nos conduz em DOGMA vai aos poucos desmontando a discursividade triunfalista dos universos nos quais suas obras encostam mesmo que apenas com as pontas dos dedos. Nesse percurso, dessacraliza ícones para, no seio mesmo de seus cortes, feridas e cicatrizes, conformar sentidos estético-políticos tão melancólicos quanto encantados para sua obra nesses tempos em que por toda a parte pululam tão falocêntricas quanto dogmáticas presunções de glória.


         The undeniable authority of a dogma and its indisputable premises have acted as a thorn in the side of artistic practice. Consequently, the histories of art have been inhabited by efforts to demolish and deconstruct these dogmas, which are intrusive and undesirable presences that, while aesthetic, are necessarily social, ethical, moral, political, and racial. It is therefore unusual that we have, with Arthur Palhano, a direct invocation of DOGMA, the title of his first solo exhibition at Portas Vilaseca Gallery. Educated in a Franciscan school, doctrinal organizations have long been familiar to the artist, whose childhood and youth unfolded between the Fluminense mountains and the northern zone of Rio de Janeiro. While conflicted relationships with ecclesiastical authority in the school environment marked his upbringing, the constant presence of icons and other symbols of a Catholicism that was as pedagogical as it was dogmatic also educated his gaze and aesthetic references. Upon understanding himself as an artist, it became inevitable for Palhano to revisit this universe that was of absolute centrality to him, elaborating installations, drawings, paintings, and videos that investigate the place of dogmatic authority in the school and the church, as well as accessing the memories of subversion and profanation of these powers in the context of a Catholic school, such as the scribbles and scratches on a school desk — a fabled memory in "Homenagem à garota mais bonita da escola" (2022).

         As an example of this moment in his production, DOGMA presents "O lugar do ícone" (2019), a video installed at the meeting point of two walls, reminiscent of Kazimir Malevich’s iconic painting "Black Square on White Background" in the 0.10 exhibition (St. Petersburg, Russia, 1915). Both Malevich and Palhano insert their poetic gestures into the space that the tradition of the Orthodox Church names as the "red corner": the quintessential location of religious icons, a symbolic point of convergence of paths, and thus, a place of reverence. This tradition remains alive in homes in Rio de Janeiro and other parts of Brazil.

         While the Russian did so primarily due to Byzantine tradition, the Carioca artist is also interested in the dialogue with the canon of painting in which Malevich is situated, as his video installation references multiple dimensions and politics of icons. As Palhano approaches, with a camera in hand, the sacred images of churches in the capital of Rio de Janeiro, he touches them with his gaze as if to profane them through the brushing of his fingers. What we see in DOGMA is that this is not an isolated gesture but rather an implicit program of his work when dealing with the iconological territory of both Christianity and art. Touching things has acquired density as an aesthetic and political operation in his recent production. In this direction, the painting "Dedal" (2021) is emblematic, arising from the accidental encounter between Palhano's fingertips and a still-wet canvas. There, the force of the imprint of his fingerprints on the oil paint revealed the pictorial vocation of the gesture of touching, profaning the presumption of sacredness and immaculateness of painting as a canon, genre, and icon.

         Furthermore, as if activating memories of drawing on the walls and desks of school, excavating the wood of the desks to imprint the evidence of his presence, alongside "Dedal" — a painting born from pressure — other works emerged in parallel, committed to less classical painting techniques. For Giorgio Agamben, to profane images is "to return them to the common use of men," challenging the rites and institutions that, in sanctifying them, keep them separate from the realm of the ordinary. As the philosopher illustrates by drawing on anthropology, one of the "simplest forms of profanation occurs through contact... in the very sacrifice that realizes and regulates the passage... from the human sphere to the divine... It is enough for the participants in the rite to touch [the meats reserved for the gods] for them to become profane and can thus be simply eaten. There is a profane contagion, a touching that disenchant and returns to use what the sacred had separated and petrified."

         Starting in 2021, Arthur Palhano began to knife, scrape, and shave his paintings, which have been constructed not by addition, but by subtraction of layers: an exercise in prospecting that allows images to emerge from within the works, from the depths of their own oil paint and enamel surfaces. By scrutinizing them layer by layer, carving the paintings — a technique of gouging that Palhano also uses to create the sculptures present in DOGMA: portraits emerging from blocks of plaster shaped by hammers and screwdrivers — inaugurates yet another form of the presence of time in the artist’s work. Arthur, who for years painted dry branches veiled by thin layers of white, has been interested since early on in impermanence, time, and its transformations. Among other examples of this research are the various images of death in his work or the metronome installed in "Terraço Coberto" (2020), an intervention-exhibition held in his family’s home during a period of nostalgic emptiness of the residence. Now, by painting through prospecting, Palhano experiences a new unfolding of this field of interests, approaching a kind of telluric experience of time: one that comes from the surface, that occurs in the sedimentation of matter, and manifests through its cracks and fissures.

         Excavating painting, a technical-formal operation akin to an archaeological gesture, thus acquires political significance. By bringing to light the oldest layers of paint, textures, and colors, the artist acts against the supposed linearity of time, disturbing its successive and progressive version with the persistent presence of that which should have been left behind. His operation is a form of exhumation of what painting once was, composed from a historicity that allows for the coexistence of different layers of time. We are faced with a historical consciousness that, in Arthur's work, becomes a summons to also exhume the canons of art itself, and particularly European painting — the icons that, along with the school and Catholicism, DOGMA allows itself to investigate and profane.

         The recent work of Palhano thus occupies a space between the necrophilia of art and the necropolitics of the world. Inheriting the tradition of still life, it does not escape the fascination with the end of life, as seen in the series "Empatias programadas" (2020), portraits of animals killed by the artist in the virtuality of the game GTA V. At the same time, it does not conform to the current paradigms of finitude with their programmed (and increasingly accelerated) obsolescence, nor does it relinquish the force of presence — as matter, vestige, memory, ghost, etc. — of that which is supposedly no longer (or not) alive.

         In this way, Palhano sets out to exhume Morandi's, Bonnard's, or Gauguin's by prospecting the surface and the immanent temporality of his own paintings, performing a physical gesture also experienced in the memory and imagination of the artist. With the help of knives and other sharp objects, he scratches the last layers of paint to recover the persistence of images that remained in a spectral state — whether on canvas or in his mind. Invisible presences waiting for the possibility of becoming images as they come to light, touched by the artist's hands and the fingers of the world. In his own way, Arthur Palhano then composes his unique "encyclopedia of art history," revisiting his own icons by cutting them not to victimize them, but to exhume them, bringing them back to a visible life. The desire to smooth, with his eye-fingers, the images of a gloomy church altar converges with the wish to claw, with his hands and knife-fingers, the canons of art. Between the reverence and profanation of these icons lies the appetite to bring them close and the longing to touch them. In this ethical and political force of manipulation and manufacturing of idols, we witness Arthur Palhano’s encounter with another possibility of the dogmatic, DOGMA 95, a cinematic movement launched in 1995 based on a manifesto signed by Thomas Vinterberg and Lars von Trier. In its lines, the Danes presented what would become known as the "vow of chastity": a call for filmmakers around the world to re-approach a cinematic modus operandi antagonistic to the hegemony of post-production that then prevailed in Hollywood and in the work of directors like Steven Spielberg.

         Among the "vow of chastity" were a series of rules aimed at acting as productive limitations, exciting the creativity and ethical-aesthetic commitment of filmmakers not with visual effects, narrative devices, or miraculous resources, but with the plot and characters presented in a way inherent to the scene and its space-time. Preventing sound from being produced separately from the image, prohibiting the creation of "genre films," or requiring the camera to be held in hand became technical provocations that led the authors affiliated with DOGMA 95 to question the political nature of their films and respective aesthetic choices. Responsible for works like "Festen" (1998) or "The Idiots" (1998), the directors of DOGMA 95 — who should not be individually identified as such, but rather as part of the collective that makes a film possible — would only have their works recognized as part of the movement if their productions were evaluated as such, which is why they had to display, at the beginning of their films, the certificate proving that the work was produced "in accordance with the rules and intentions" of DOGMA 95. As they confess, the film crews inevitably ended up bending one or another rule.

- CLARISSA DINIZ