Em suas primeiras investigações pictóricas, Palhano teria se debruçado sobre o que nomeou de 'imagens frias' — imagens esmaecidas, soterradas pela alta produção imagética, pela hipervisibilidade do mundo moderno e seu constante anseio pelo consumo.  A perda de opacidade e presença dessas imagens, segundo o artista, decorreria da superabundância de 'imagens quentes', cujo apelo reside na alta visibilidade e sua intricada adesão à mídia de massa. 

Desse modo, sua produção estaria comprometida com o resgate de imagens ordinárias que, quando transpostas para o campo da pintura, contornam a dimensão trivial a que pertencem para ocupar a excepcionalidade das discussões pictóricas — ainda que, em sua autonomia, questionem sua própria condição privilegiada, já que subvertem questões fundamentais da tradição da pintura e do suporte. 

A técnica utilizada por Palhano desdenha ironicamente do dinamismo da produção de imagens na contemporaneidade. A partir da sobreposição de encorpadas camadas de tinta a óleo — somadas ao seu extenso tempo de maturação e secagem —, elabora uma espécie de contradição que relativiza as atuais relações entre produção e consumo, ao esculpir nessas espessas camadas de tinta e dilatar o tempo de retomada dessas imagens, trazendo-as à superfície para serem rememoradas no mundo.

Entretanto, ainda que sua produção atue numa espécie de desmedida entre o resgate de imagens fragilizadas pelas dinâmicas do mundo e seu reposicionamento no debate privilegiado da arte, Palhano encontra, em sua tarefa de ressignificação, pequenos espaços de respiro e lampejos do que viria a se tratar de uma iconografia de apelo biográfico. De modo que as 'pequenas imagens', que fundam seu repertório imagético, encontrem espaço no vasto vocábulo iconográfico da história da pintura. 

Essas pequenas presenças clandestinas acalentam a maneira pela qual persiste o vigor de suas decisões em pintura — sejam formais ou conceituais —, sobretudo porque em parte desses lampejos de existência persiste no sol a presença de sua mãe, no palhaço a lembrança afetiva de seu padrasto, ou como na imagem da casa que, neste caso, corporifica questões partilhadas entre o artista e sua irmã.

Essa espécie de partilha gestual, que descompensa a causalidade das representações facilmente assimiláveis do contexto histórico da pintura, teria conduzido sua produção a outras instâncias para além da retomada de suas 'imagens frias' — mas a uma nobre atenção aos objetos observáveis que, embora também flutuem no lugar ordinário cotidiano, conquistam espaço formal e o lugar de visualidade excepcional em suas pinturas, de modo a horizontalizar uma experiência humana a partir da condição de existência dessas imagens, como em uma crônica dos dias alheios. 

Neste sentido, Palhano volta sua atenção ao acaso dos encontros, trazendo para o corpo da pintura parte desses objetos que possuem qualidades crônicas. Surgem, a partir disso, imagens com outras densidades de presença, sobretudo porque persiste nelas uma espécie de ética ao serem mantidas suas narrativas simbólicas particulares mesmo quando deslocadas da dimensão objetual para a bidimensionalidade da pintura. Uma placa de restaurante com a figura de um garçom, bainhas de faca, formas de sapateiro, martelos de coureiro e outros objetos que se apresentam a Palhano tornam-se co-autores na transposição de suas representações, de modo a nos lembrar que toda experiência sensível humana se trata da experiência das coisas como um todo. As coisas ordinárias não mentem.
- YAGO TOSCANO